domingo, 29 de novembro de 2009

ESTE SOL DO MEU PAÍS I SACRIFÍCIO DA TARDE



I
SACRIFÍCIO DA TARDE

" ... que o meu erguer de mãos seja como um sacrifício da tarde..."

1

Há muito que eu sentia o Teu rumor
À minha volta! E nunca o exprimi..
Há muito que tudo me falava
Dessa loucura que provém de Ti!
No ramalhar da minha acácia triste,
Na nuvem, sonho de água na distância,
Na espuma prateada dos ribeiros,
Nos sonhos e quimeras da infância!...
Havia em tudo, tudo o que sentia
E que na vida jamais exprimi...
Silêncios que não soube descrever
E versos não escritos que eu senti!
E quis ser monge nessa terra agreste,
Pintor de nuvens que não tem pincel!
Rasgar as minhas carnes nos rochedos,
Magras carnes envoltas em burel!...
De S. Francisco eu herdara os sonhos,
Sonhos que ainda hoje me comovem!
Anseios que abriram meus caminhos.
Diversos mundos a sorrir num jovem!
Corri a vida em busca da verdade...
Sonhei a vida de olhos bem abertos!
Tudo morrera como a luz do Outono
Ou como estrelas morrem no deserto...
Mas presentia um rumor estranho
Transfigurando tudo ao meu redor!...
Perdido nas alturas do meu sonho,
Em plena serra, cobri-me de suor!

2

Foi então que Tu apareceste,
Com sinais que não soube descrever!
Ficaram cheios de luz os meus caminhos
E transformou-se em mim todo o meu ser!

Foi nessa altura, Senhor, que me disseste
Abrindo os braços por sobre os continentes...
" Eu sou manso e humilde... e estarei
Eternamente com os inocentes...

Hão-de vir homens e pisar meus passos!
Sepultá-los na curva dos espaços...
E não haverá gritos nem protestos!!!

Não venham com palavras, quero factos!
Não venham com lacunas, quero ideias!
Porque não há-de transformar-se em actos
O sonho imenso que corre em vossas veias?!

Não me tragam lacunas, quero antes
Afirmações cheias de conteúdo!
É melhor, ó Poeta, que não cantes!...
Em certas horas o silêncio é tudo..."

3

Minha vida era flor que não abria...
Flor que por bem pouco não murchou!
Em Ti, Senhor, senti que revivia,
Foi nos Teus lábios que floriu, sangrou!...

Sem Ti, tudo no mundo me faltara...
Sem Ti, os meus anseios eram nada!
Vieste... em mim gradou toda a seara!
Sorriste... iluminou-se a minha estrada!

4

Senhor do meu destino triunfante,
Hoje levanto as mãos para louvar-Te...
As minhas mãos, num gesto suplicante,
Senhor meu, que estás em toda a parte!
Senhor, que me sorris se estou no leito,
E me amparas - eu caio tanta vez!
Se Tu não pulsasses no meu peito,
Minha vida era eterna viuvez!
Ai quantas dores, quantas dores violentas
Me atormentam quando estás ausente!
Quantas batalhas perdidas e sangrentas!
E rosas desfolhadas pelo chão,
Sonhos vivos quebrados na espessura!...
Tanta vida sem luz nem expressão!...
Sem Ti, o sofrimento é a tortura!

Contigo, transformei as minhas chagas!
Contigo, o meu amor ainda há-de
Consolar quantos choram porque Tu
Abriste em mim nascentes da Verdade.

5

Eu não temo a geada nem a neve;
Correndo vales e montes pedregosos,
Mesmo de pés sangrando, a alma é leve
E canta nos atalhos dolorosos!

De pele e carne sou... Deus me vestiu
Tão puro, mais que aos lírios do jardim.
Eu bendirei a dor que me remiu
"E soltarei a língua contra mim!"





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