sexta-feira, 11 de novembro de 2011



JOÃO FOLGADO FRADE CORREIA


Data de Nascimento 17 de Abril de 1913

Local de Nascimento
Rosmaninhal
Idanha - a - Nova

Castelo Branco

Licenciatura em Ciências Históricas e Filosóficas
Faculdade de Letras
Universidade de Coimbra


Casado com

Margarida de Campos e Silva Frade Correia



Filhos
Maria Margarida da Silva Frade Correia da Silveira Serejo
João José da Silva Frade Correia
Maria Inês da Silva Frade Correia Gomes de Castro
Alexandre da Silva Frade Correia



PUBLICAÇÕES






  • LIVROS



FLORES SINGELAS
POESIA
1933
Tipografia Minerva
Vila Nova de Famalicão

SERÁS SANTA NOS MEUS BRAÇOS
POESIA

INCÊNDIO
POESIA

PORTUGAL: UMA ESPERANÇA E UMA CERTEZA
1965
Mocidade Portuguesa/Educação patriótica/Palestra
Delegação Distrital da Mocidade Portuguesa

POESIA E REALIDADE EM ANTÓNIO NOBRE
1968
Castelo Branco
Estudos de Castelo Branco

ESTE SOL DO MEU PAÍS
POESIA


  • REVISTAS


SEIVA


Seiva
Outubro de 1971
Número comemorativo do Bicentenário de elevação de Castelo Branco a cidade


Revista de Cultura e Informação
Director João Frade Correia
Propriedade e Edição Escola do Magistério Primário Particular de Castelo Branco

  1. Servindo de Introdução
  2. Alvará de Elevação de Castelo Branco a Cidade
  3. Fundação e Origem de Castelo Branco
  4. Castelo Branco - Infância - Castelo Branco do meu sonho - Aqui me tens, voltei... - Deus me dê Castelo Branco para minha sepultura - Senhora de Mércules - Ó Beira da minha Infância - Pequenos Pintores albicastrenses
  5. Em Louvor da Beira Baixa - A Beira Baixa - Vale da Ocreza - Um passeio à Gardunha - Sintonia do Outono - O Arquivo Distrital - A Biblioteca de Castelo Branco - O Padre António de Andrade
  6. Anos de Silêncio - A Escola de Pedro Nunes - O Ensino Normal na Beira Baixa - O Albergue Distrital de Mendicidade
  7. O Maior Amigo da Escola
  8. Instituto de Obras Sociais - pelo Dr. Reinaldo Coimbra Pinheiro
  9. Cursos de Monitoras Sociais
  10. Valorização da Beira Baixa
  11. Curso de Estudos Ultramarinos
  12. Cântico de Desespero e de Esperança

  • "Nunca me dei aos poucos. Dei-me sempre todo e a tudo o que amei e amo: às pessoas e às coisas. As nascentes da saudade brotaram do mais fundo da minha vida... É aí que está a razão de ser das coisas e da própria realidade..."
  • "A Beira...província onde nasci, nasceram meus pais, minha mulher e meus filhos...As suas paisagens, tantas vezes dolentes, moldaram as minhas paisagens interiores...Amo apaixonadamente aquela província, tão bela e incompreendida! Trago-a dentro de mim; corre em minhas veias;choro-a com as minhas próprias lágrimas de alma e canto-a com a pobreza do meu canto..."
De "Este Sol do meu País"

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Castelo Branco - Infância - Castelo Branco do meu sonho - Aqui me tens, voltei... - Deus me dê Castelo Branco para minha sepultura - Senhora de Mércules - Ó Beira da minha Infância - Pequenos Pintores albicastrenses
1 - As impressões que se seguem foram recolhidas das minhas "Memórias Íntimas". Não há nelas continuidade, mas nada alterei, reduzindo ao essencial, o muito que fui escrevendo no decorrer da minha vida. Impressões da juventude, aliadas a outras já escritas e sentidas mais tarde, à medida que o tempo e a disposição mo permitiram. A maioria dos factos emocionais conserva a nitidez e intensidade das diversas fases por que fui passando.
2 - Da minha aldeia recebi todas as recordações da infância. Fiquei e para sempre preso às pessoas com quem convivi. Às pessoas e às coisas... A casa humilde onde nasci; as paisagens que pertubaram, na infância, os meus sentidos e incendiaram, depois, a minha imaginação; os seus montes, caminhos, veredas...A Escola e o Professor; o tocar dos sinos, convidando-nos para as mais diversas cerimónias; da toada alegre de um casamento ou de uma procissão, alvoroçando toda a aldeia; o toque plangente por uma alma que abandonara este mundo... As noites de luar passadas no adro da igreja ou nos cruzeiros de S.Roque e S.João... tudo isso deixou em mim uma poalha de religioso sentimentalismo, que me acompanhou durante toda a vida! Paisagens da infância e adolescência que transfiguraram o meu mundo interior como se fosse uma maravilhosa síntese de tudo quanto amei!...
3 -



" aos penedos e às ervas eu contei

a dor que trago no meu peito..."









6 -Influenciado por uma poesia de Bernardo de Passos, escrevi, certo dia, repassado de profundo sentimento, o soneto que ainda agora recordo com emoção:








Tarde de chuva fria, muito fria
adormecendo as almas e as coisas!
Doce Tranquilidade! Avé-Maria...
Dentro de nós as formas luminosas.



Gotas... a fazer rendas caprichosas
nas folhas, na poeira... E a agonia
de tanto sonho liquefeito em rosas
dessedentando a terra, a penedia!



Beira, irmã do sol e da tristeza,
por te viver é que a minha alma reza
toda essa vida que eu em ti passei.



Tarde de chuva,de poalha...mansa,
regaço dos meus sonhos de criança...
Castelo Branco...aqui me tens...voltei.









7 - A canção dedicada a Castelo Branco é, iguamente, inspirada nas mesmas fontes dos mais elevados pensamentos que minha alma experimentou:






Eu trago os meus olhos cheios
Do teu brilho e do teu canto,Castelo Branco, cidade
Do teu riso e do meu pranto!
Castelo Branco com o seu Alto Castelo velhinho;Com paisagens de Outono
que embriagam mais do que o vinho.
Descubro, por onde passo,
Velhas pegadas de outrora...
Meu sonho ardente de infância
Aqui nasceu e aqui mora.
Há outras terras, eu sei
Mais ricas de monumentos,
Mas nenhuma, como tu,
Enlevou meus pensamentos.
Andei de capa e batina
Pelas tuas ruas velhinhas;
Nas noites enluaradas
Soube os segredos que tinhas.
Ó velhas tardes da Mina
E do Cansado, onde estais?
Ó sonhos da minha infância,
Porque, teimando, voltais?
Porque vindes recordar
Aquele que fui se agora
Já não sou quem antes era,
Sou uma sombra de outrora!
Castelo Branco, ainda
Sei de cor as orações
Que aprendi no teu regaço
Com o peito cheio de ilusões!
Ainda vou à Capela
Da Senhora da Piedade.
Dantes rezava à Esperança,
Agora rezo à Saudade!
Ainda vou aos lugares
Que dantes ia... ao Jardim...
Mas os buxos e as estátuas
Já se esqueceram de mim.
Andarei por longes terras
Do bem ou mal à procura,
Deus me dê Castelo Branco
Para minha sepultura



9 - Toda a Beira Baixa ficou a fazer parte de mim, nela me enraizei e ela oferecia-me os tesouros das suas entranhas que eu mal soube cantar e transmitir! Mas na minha alma nunca se apagara o canto que brotava das raízes da terra com a seiva a vivicar constantemente as lágrimas da aurora ou do sol-pôr:

Ó Beira da minha infância
vestida dos meus cuidados,
também meu coração anda
perfumado pelos teus prados.

Terra de casas escuras,
de almas sombrias de espanto,
onde se reza chorando
e se chora em triste canto.

De montanhas solitárias,
almas perdidas, mas belas...
De vasos feitos de talhas
a enfeitar as janelas.

Terra de grandes que mandam,
de pobres que nada são,
mas que têm o Evangelho
de Cristo no coração.

Terra minha! Também eu
todo, todo te pertenço,
e sinto-o quando te deixo
e esvoaça na gare o lenço

daquela que em ti nasceu
me deu filhos que teus são
Terra trigueira das almas,
terra alourada de pão...

Das neves altas da Estrela,
da Gardunha pedregosa...
Ó Beira aqui tens meu canto,
mal sei escrever em prosa.

Mas brilha dentro de mim
o perfume de teus prados,.
a névoa das tuas tardes,
orações dos descampados.

Terra enfeitada de sonho!
filha da minha paixão...
Terra trigueira de almas,
Terra alourada de pão.


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SINFONIA DO OUTONO

Outono da minha Beira...
As folhas, num ritmo leve,
Receiam o teu olhar,
Pois vão morrer muito em breve!...
Há qualquer coisa de estranho
Na tua face doente...
O sol, o ar, a paisagem...
- É tudo tão diferente,
Outono da minha Beira,
Há quanto te vivo... há tanto,
Se corre nas minhas veias
O teu macerado encanto!
O sol espreita... a folhagem
Toda estremece de o ver.
Outono da minha Beira
Quem te pudera beber...




PERSONALIDADE HUMANA

da concepção sónia à metafísica existencial de Heidegger



Dissertação para a Licenciatura em Ciências Históricas e Filosóficas, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra no ano de mil novecentos e trinta e oito


ENSINO
  • Salas de Estudo

  • Escola Comercial Particular de Pedro Nunes de Castelo Branco
A Escola Comercial de Pedro Nunes foi criada na cidade de Castelo Branco no ano lectivo de 1943-44.
Até esta altura, pelo menos na província, o ensino técnico tinha pouca frequência e pode dizer-se que o ensino técnico particular praticamente não existia. A sua criação veio na altura própria, pois na cidade de Castelo Branco não existia um único estabelecimento de ensino que ministrasse qualquer curso nocturno, onde os rapazes e raparigas que trabalhavam durante o dia, pudessem valorizar a sua vida e alargar os legítimos horizontes das suas aspirações.
Como a Escola de Pedro Nunes era particular e não existia em todo o distrito qualquer estabelecimento técnico que ministrasse o ensino comercial, inscrevemos os primeiros alunos, no ano lectivo 1943/44 na Escola Industrial e Comercial de Jácome Ratton de Tomar, então dirigida pelo dr. Tamagnini. Mas o nosso desejo era dotar Castelo Branco com o curso complementar do comércio ( Dec. 20420), curso que apenas existia então nas cidades de Lisboa e Porto.
Depois de muitos esforços, conseguimos esse objectivo e os nossos alunos passaram a inscrever-se na Escola Patrício Prazeres de Lisboa, da qual era Director o dr. Joaquim Ferreira de Sousa Júnior.
A maioria dos nossos alunos era pobre: lutava com dificuldades de toda a natureza. Por isso era necessário fazer tudo para que os seus exames fossem efectuados em Castelo Branco! Os alunos não só lutavam com dificuldades económicas como não dispunham de tempo para se deslocarem a Lisboa fazer os exames!
Ninguém pode calcular como foi difícil vencer aquele obstáculo!
Não havia nada que oficialmente permitisse aquela regalia. Deslocamo-nos a Lisboa e, depois de muitas horas de desânimo e de alguns dias de sofrimento, conseguimos que o então Ministro da Educação Nacional, Prof. Doutor Caeiro da Mata, compreendesse a situação dos alunos da Escola Pedro Nunes e autorizasse a vinda de um júri a Castelo Branco para fazer exames oficiais.
E durante anos se manteve esta situação.

O ENSINO NORMAL NA BEIRA BAIXA
O EXEMPLO DE UMA ESCOLA
  • Escola do Magistério Primário Particular de Castelo Branco

Foi criada no ano lectivo 1950-51 - Diário do Governo Nº 293 - 3ª Série - 15-12-952 - Despacho ministerial de 29-11-952.
Em 6 de Maio de 1952 recebeu uma embaixada de normalistas da Escola do Magistério de Cáceres. Sucederam-se várias visitas, estreitando-se os laços de amizade entre os dois países.



O ALBERGUE DISTRITAL DE MENDICIDADE



Cântico de Desespero e de Esperança



1 — Meu Deus, aqui estou serenamente, neste entardecer de Agosto em que tudo parece mais luminoso e as sombras das árvores se «adensam e alongam» nos pinhais! Recordo o poeta Lopes Vieira:


Pinhal de heróicas árvores tão belas, Foi do teu corpo e da tua alma também Que nasceram as nossas caravelas Ansiosas de todo o Além...


Tudo, nesta hora maravilhosa de sofrimento, perpassa na minha imaginação: desde os golpes duros dos homens, ao sorriso das crianças e à inquietação da juventude!


O perfume que me vem dos pinheiros e do mar, penetra vivamente em mim, atenuando a minha dor e esta hora de dura provação! Tenho as mãos limpas e o coração dilacerado! Tanta gente a trabalhar na sombra, envenenando as vidas e consciências alheias! Os ímpios não suportam a luz do sol e da verdade. Escondem-se e actuam! Tentam conquistar os mais poderosos e, depois, em conjunto ou separadamente, amordaçam e vasculham a própria podridão das suas almas. Almas que cheiram mal, que têm o sabor das suas ideias e que os outros suportam por medo ou cobardia.


Por isso, só as almas simples podem saborear a luz doirada do sol, o aroma das sebes floridas e as suas irradiações luminosas! Só elas podem sentir a vida sem horizontes, que está para além dos mares e dos pinheiros e que se pressente no agonizar desta tarde luminosa!


Nesta beleza sem fim, quero renovar toda a minha vida, na resignação, na humildade e na obediência!


Penetro no mais fundo da minha alma e, então, descubro a imensidade do meu nada.


Meu Deus, aqui estou silenciosamente, pois jamais fui capaz de descobrir noutro lugar a serenidade tão necessária à minha alma. Só aqui, beijando no sol a tua face resplandecente, eu sou capaz de sentir as maravilhas que prodigamente criaste...


Por isso aqui estou ouvindo o mar, ora a bater enfurecido nos rochedos, ora espreguiçando-se na areia em rendilhados caprichosos!


Que seria de mim, se não fosse o perfume que sinto na alma? Que seria de mim, se não tivesse a ternura do teu olhar que dulcif ica a minha existência?


Dei-me a todos e a tudo. Lutei pelos desamparados! Tentei valorizar ao máximo a minha vida para poder ser útil ao meu semelhante!


Para quê, sim para quê?


Mas nesta vida tudo parece feito de contrastes: a nossa própria alma e a natureza inteira! Enquanto as aves cantam docemente, os homens que colocaste no meu caminho, indiferentes à verdade, sentem a alegria do sofrimento alheio!


Que Terra tu me deste, meu Deus para viver! Como ela parece amaldiçoada pelos homens!


2 —«Junte-se a isto a intenção tão comum, de fazer sofrer os outros, por malícia, por crueldade, por simples desejo de vingança, em certos casos tão somente para poder gozar da dor alheia, e pergunto a mim mesmo como será possível o não ver esta verdade, tão evidente, que vivemos todos na injustiça? Será isto a vida verdadeira? Não me posso resignar a crê-lo: Seria absurda e seria má. E não posso acreditar, outrossim, que em virtude de um concurso de circunstâncias, que ninguém pode acreditar nem mesmo prever, o que é absurdo se torne bom». (Carlos Renouvier. Últimas Conversações—Pags. 55-56).


Sim, não posso acreditar que numa sociedade que se diz cristã se saboreie o sangue das vítimas inocentes, intencionalmente preparadas para o holocausto!


Eu sei, meu Deus, que Tu não és indiferente a todo este mar de dor que se sobrepõe ao mar azulado deste maravilhoso S. Pedro de Moel! Sei que me farás justiça, mas receio que chegue tarde, dando tempo demais aos algozes que se banqueteiam com- o repasto de corações puros, de almas honestas amordaçadas pela noite da existência!


É um fim trágico, uma caricatura da vida verdadeira, tantos anos ordenada para o bem de todos e de tudo!


Remorsos? O criminoso profissional já não sente remorsos! A consciência foi-se adulterando como o ferro exposto à chuva, durante anos e anos!... Dentro de mim sinto as mãos suplicantes dos desesperados, bocas espumando raiva, tanto suor inútil, tanta calúnia! Fizeste-me compreender na pequenez do meu nada a grandeza redentora do teu sofrimento ?


Onde estão as pegadas dos teus Apóstolos do Passado? Onde se encontra o teu Evangelho na vida dos homens? Onde estão os Mestres e as Escolas, espalhando a Tua Mensagem? Onde estão as mães de outrora abraçando-te no abraço que davam a seus filhos?


Quem espalha pelas escolas, pelos cafés, pelos cinemas... tanta imoralidade, tanto cepticismo, tanta miséria de filósofos derrotistas, tanta neblina impenetrável de ideias? Quem?


Lembra-te, ó meu Deus, que vivemos na Terra que tu nos criaste, com rios caudalosos, mares e oceanos sem fim, que entoam eternas canções de amor à tua grandeza! Lembra-te que somos frágeis! Não esqueças que a civilização que os nossos antepassados criaram à sombra acolhedora do teu Evangelho, espalhando templos e maravilhosas catedrais... parece sossobrar!


Eu próprio me sinto naufragar ao ver tanta coisa a destuir a seiva fecundante da tua vida em nossas vidas! Não Te esqueças de nós, que vivemos neste mundo em contínuas mudanças e cheio de contrastes dolorosos! Não Te esqueças de nós,


Pai Nosso Que estais no Céu!


No Céu e em toda a parte. Tu fazes crescer as searas, alourar o pão; perfumas os pomares! Murmuras docemente nos regatos e pareces escondido nos próprios sonhos que nunca desabrocharam! Que és entusiasmo do adolescente e corres nas lágrimas da mãe que perdeu o filho! Que incendeias o poente! Que estás no perfume dos lírios! Que és o amparo dos abandonados e a aragem que mitiga as dores de corpo e de alma! Tu que és a própria poesia feita sonho, a Parábola que os homens tentam decifrar; a Verdade verdadeira que tantos filósofos não entendem!... O fogo que não se apaga! Só tu dás sentido ao sofrimento, e, por isso, não quero desesperar, nem cair. A seara é imensa, mas está deserta. O trigo cresce de mistura com o joio e já mal se distingue um do outro. É preciso que as espigas gradem, acariciadas pelo teu calor fecundante. Mas onde encontrar os teus obreiros, onde?


Todos falam de Paz, da Paz de um mundo que parece perdido para sempre!


Mas nas espadas continuam tintas de sangue, o ódio enfurece as almas e as cortinas de esperança desfazem-se contra as cortinas de ferro. Mas não devemos desesperar por isso eu gostaria de dizer eternamente,


Santificado seja o Teu nome.


Sim, porque eu existo. O mundo existe. E sei que nem eu, nem o próprio mundo somos por Ti abandonados. Quero viver a vida com dignidade. Nunca amaldiçoar ninguém. Como tu, quero beijar os lábios dos que cospem nas minhas faces! A todos os meus inimigos eu devo o que sou, pois sem eles nunca reconheceria a pequenez da minha fragilidade. Ensina-me a viver esta vida onde tropeço constantemente, onde caio diariamente; onde faço constantes esforços para me emendar. Oinde tantos me faltam ao prometido e onde eu falto a tanta gente, com promessas que não cumpro e desejos que não realizo. Ensina-nos o sentido verdadeiro e real das estradas desertas! Dos esquecidos de pão e de carinhos... Por isso, por tudo quanto digo ou não sei dizer-te...


Venha a nós o vosso Reino...


Vejo que as nações se degladiam. Um mar de sofrimento invade a Terra inteira! Mas não foi para isto que tu nos criaste, não! Quando é que a verdade dissipará a mentira e a calúnia? Por que permitiste

que os inocentes fossem publicamente caluniados?

Mas apesar disso, por tudo isso...


Seja feita a vossa vontade...


Assim na terra como no Céu...

Sim em toda a parte. Só tu és a fonte, a origem, a Verdade. Na dor infinita, nas gelhas da alma, nas profundidades do mar ou do inconsciente humano...

Volto de novo a dizer-te que não quero filosofias nem conhecer o sentido de tanta inutilidade, nem a confusão de tantos sistemas políticos que se degladiam e contradizem. Quero ser simples como a simplicidade do teu olhar; como a doçura dos teus gestos! Ser simples, como a luz transparente das pupilas dos teus olhos. Ser puro como a neve das montanhas. Tenho um coração que sofre e uma cabeça que escalda. Mãos que nem sempre acariciam ou erguem para Te louvarem. São como os choupos que ladeiam os riachos. Quero viver cada momento, como se fosse o último e o mais santo da minha existência. Quero abandonar o ontem que deixou sulcos na minha sensibilidade. Vivo da fragilidade, do alimento da alma e do corpo. Por isso, dá-me e a todos os seus irmãos — pois todos somos teus filhos:


O pão de cada dia...


Tu, ó meu Deus, que vestiste com tanta beleza os líricos dos campos; que enchestes de perfume os vales e diluíste o oiro do teu manto no poente que agora contemplo, maravilhado!... Que sabes que na minha alma se encontra a essência da tua divina presença misturada com o amargor das coisas do mundo; Tu que estás presente em todas as distâncias; que sabes quem eu sou e quem não sou...


Dá-me, logo ao levantar e em cada dia que desperto para a vida, um pensamento elevado e faz que o reviva constantemente, para que todos os seus momentos sejam uma Oração!

Que tudo ordene para ti: os meus pensamentos, as minhas palavras e as minhas acções!...

Sabes que me revolto contra quem me fere e me persegue. Que borbulha na minha alma uma ânsia de chicotear quantos injustamente me perseguem sem eu saber por quê. Mas mal o teu sorriso vem ao de cima dos meus sentimentos, esqueço o mal que me fazem e a todos desculpo... Por isso,


Perdoa-me todas as minhas ofensas...


E todo o mal que fiz! E todo o bem que mão fiz ou não soube fazer!


Tentei viver em comunhão espiritual com todos os homens! Senti quase sempre a inquietação das almas e dos povos. A grande maioria deles não passa de galhos secos, sem uma vida digna! Não conhecem a seiva divina que alimenta e robustece os ramos viçosos dos grandes ideais.


Quantas vezes a estiagem não entra dentro de mim, quantas?


Eu quero emendar-me e registar todos os meus erros e defeitos,


fazendo sobre todos uma crítica honesta e construtiva. Mas, por tudo Te peço,_


Não me deixes cair em tentação!...


Quero expiar as minhas culpas e as alheias, pois sou responsável por todos os que sofrem, mesmo que não tenha sido o culpado dos seus sofrimentos.


Não me deixes cair em tentação e evita as preocupações da minha alma, que tudo destroiem e nada edificam. Que deixam nela sulcos a sangrar e entorpecem o vigor dos sentimentos! Por isso te peço: deixa--me viver a serenidade desta tarde. Comungar a beleza dos pinheiros e a inquietação do mar e


Livra-me de todo o mal!...


E quando, serenamente, a morte me vier buscar, faz que nessa hora derradeira eu bendiga ainda o teu nome. E que para todo o sempre ele seja bendito, entre todos os homens e coisas que criaste.


Bendito, como este sofrimento todo feito de injustiças e invejas, que eu julgo não merecer e que os meus irmãos mão mereciam também...



S. Pedro de Moel, 10 de Agosto de 1970.



João Frade Correia




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